segunda-feira, 24 de setembro de 2012


Missa de 7º dia pelo Dr. Luiz Goes:

2ª pelas 19 h , na Igreja Matriz de Cascais
3ª pelas 19 h na Igreja S. João de Deus em Lisboa- junto da praça de Londres.
3ª pelas 19 h na Sé do Porto, antecedendo um pequeno concerto 18:15h, em homenagem a este, nos claustros da sé.

Relembro que a Academia do Porto, decretou luto académico e estará em peso nesta singela homenagem.
COIMBRA- A confirmar - (desconheço para já alguma iniciativa confirmada mas penso ser na Igreja de St Cruz pelas 19 h igualmente uma missa com o mesmo propósito)

Permitam-me uma breve escrita na manhã em que recebi a notícia triste de um amigo que partia. (desculpem os erros.. é muito extenso para corrigir)

O Dr. Luiz Goes, para além do belíssimo espólio de letras e músicas que nunca se apagará nem esquecerá, e que será certamente um marco e referência na história da música de “matriz Coimbrã” (como ele gostava de chamar), pois nunca o deixaremos esmorecer, cantando e tocando para a eternidade, deixou acima de tudo um testemunho pessoal.

Este, (LG), marcou e pautou a sua vida por uma sempre boa disposição, altruísmo, e num gesto humilde, sempre a agradecer um qualquer convite, quando deveríamos ser nós a agradecer a sua sempre disponibilidade, amabilidade e carinho. Importa pois relembrar não só o seu testemunho enquanto poeta e músico mas acima de tudo pela pessoa que foi.

Estarei na frente desta senda e sempre disponível como ele me ensinou, mas não poderemos deixar esmorecer esta data de reflexão sobre quem foi Luiz Goes, o que é o fado (de Coimbra particularmente, mas distinguir claramente e objetivamente do de Lisboa), sua história, sua evolução, suas particularidades e identidades resultantes de uma mescla, contínua e subtil ou por vezes abrupta mudança, acompanhando os tempos e as músicas a par das culturas ou identidades culturais por vezes tão opostas.

Sem querer fazer uma história ou contar da mesma o que pouco sei, (que outros o farão melhor) sobre o fado de Coimbra, são as raízes populares de tantos estudantes que partindo das suas terras, que fizeram nascer uma nova cultura musical que se eternizou no tempo.

Levaram das suas terras os seus temas e cantigas, ritmos e sonoridades musicais tão díspares quanto o panorama cultural português de então. Estávamos no início de século XX.
Partiam com a dúvida de voltarem a não ser no Natal. Cartas trocadas, essas sim, contam a verdadeira história de “Zeca Afonso” ou de um qualquer estudante em Coimbra até ao terceiro quartel do século XX.
A estação era local de muitas lágrimas de pais que sonhavam um dia ter um filho DOUTOR.
As repúblicas eram a sua casa, as ruas a sua aldeia… e todos juntos, com um trajo igual não denotavam as diferenças entre tão diferentes estudantes.
Um de Mortágua, outro de Famalicão, um pobre outro rico, mas chegavam os dois á estação e trocavam olhares que comprometiam uma vida inteira.

Vozes como Edmundo Bettencourt, Francisco Menano ou António Menano, entre muitos, foram apenas os que primeiro registaram, um certa característica própria da música - O fado - que ás vezes ainda se confundia sem poder dizer fado de Lisboa ou de Coimbra ou do Porto.

Passámos pelas vozes de tenor onde as serenatas “à capela” tornaram célebres os ecos nas paredes de uma velha sé. Mas eram poucos!! Os que cantavam e os que ouviam!
A luz era um só qualquer ponto no céu ou umas tochas a queimar e fazer mexer as sombras das capas que por si já bracejavam na noite.
As serenatas à donzela sob a janela, trinando caixas de madeira que serviam para marcar compassos e fazer qualquer coisa como acordes desafinados para encobrir uma ou outra nota mais surda. O recolher e as formas precisas de dobrar a capa dentro da pasta….
Tantas histórias que atento, ouvia de meus pais
(…)
Uma velha guitarra em forma de coração explicava a letra do Hilário.
A “prima Amélia” ensinava-me temas como “Maria se fores ao baile”, “eu vi a Amélia”, “fado serenata”, ou “meia-noite ao luar”.
A minha mãe recontava histórias que viveu com meu pai em Coimbra. Ouvia o meu pai cantar em velhas gravações numa fita em bobine tão gasta pelo tempo como pelas vezes incontáveis que a fiz girar. Menino d’oiro, samaritana, Sepúlveda e tantos outros…
Na faculdade fugia às quintas para poder cantar em Coimbra, num espaço que já nem encontro, 1910…
(…)
Passaram os anos das serenatas, anos de um Fernando Rolim, mas igualmente de um António Bernardino. Ouviram-se outras vozes, barítonos e outros tantos, baixaram-se os tons, diminuíram os vibratos, aumentaram os portamentos, romperam-se os melismas e a 7ª sílaba tónica.
Aumentou-se a caixa e o braço, dotando o trinar e o vibrato de uma melódica sonoridade inconfundível e que distinguiu de vez o som estridente e barroco do fado lisboeta.
Apareceram os “Paredes”, e os poetas mais eruditos. Cantaram-se os poetas e aos poetas. Fizeram-se poetas e musicaram-se os poemas e os poetas.
Deixaram as quadras e apareceram os tercetos.
Mas algo ainda não temos!! O compasso binário!!, apenas uma ou outra valsa de um António Brojo.
Graças a Deus ou aqueles que ainda, com a saudável (mas contida e sem pretensiosismos) evolução da canção coimbrã, fizeram permanecer a identidade e característica incontornável da nossa canção coimbrã.
 
Chegaram os tempos em que a poesia não foi calada. E com ela se disse o que não poderia ser dito. Chamaram-se nomes com sorriso na voz, enquanto outros discutiam como roubar a fome a quem a tinha de tão pouco restava.
Chegou o “…tempo do amor onduloso”, e numa “elegia”, se narrava a história de um povo e de uma cultura.
Chegaram “Zecas” e “Adrianos” e outros tantos desenganos, que num “tempo breve” se fez ouvir a voz de quem padecia de um olhar real sobre a triste sina portuguesa.
Eram aqueles que partiam, “naquela alegre e clara madrugada”, eram pescadores e vestes pretas de “viúvas sós” que juntamente com o luto de quem cantava na sua voz, as histórias de outros tantos que sofriam e não tinham voz.
 
Chegaram as baladas, as autoestradas. A estação dava lugar aos parques de estacionamento. “Do Choupal até á Lapa” vista apenas pela janela de um táxi que já nem é preto de capa ás costas com as copas no tejadilhos a refletir o verde dos choupos.
A realidade é outra!!. Os tempos e culturas igualmente. Rituais modernos que as pedras velhas não conseguem acompanhar.
O que é velho já não importa. È trôpego e antiquado. As velhas quadras simples são simples demais e desadequadas ao contexto… mas também não se lê mais poesia!! nem sequer se lêem devagar os poemas cantados!!... Que bonitos eles são!!… e afinal, um “Homem só meu irmão”, ou uma “canção pagã”, ou uma “romagem á Lapa” saudosa, de tão contemporânea e atual que é até perigosa se torna!!.
Agora, as tertúlias e os ”copos” deram lugar ao virtuosismo “Paganiniano”…
 
Urge pois recontar a história. Cantar os poetas mas ouvir os avós, Passar o “tempo que não passa” á volta da lareira… e são os poucos resistentes e que ainda a podem contar os mais responsáveis.
São aqueles que viveram as histórias que têm o dever de se fazer ouvir, para que as histórias não se calem e não se inventem outras histórias sobre a história desta história.
Aos vivos, que me contem para eu poder contar…
Aos mortos, que me inspirem para eu poder viver…
E com eles eu possa sentir que a história que ouvi de meus pais não morreu!!!
A ti “meu querido” numa quase herege expressão: “juro e jurarei, cantarei até à morte”!
A ti, Luiz Goes que me deste a honra em te conhecer, que junto do meu pai estarás certamente, “canta, canta amigo canta, ao voo de uma ave ou a um rio”!..
Talvez a Lapa cante e em pedra grave a tua alegria…
Que aqui cantarei sempre por ti.

Nuno Oliveira Montalto

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