Serenata à Morena
Música: autor desconhecido
Letra: D. António de Macedo Papança (1852-1913)
Incipit: Quero o teu hálito ardente
Origem: desconhecida
Data: ca. 1870-1875
Eu não tenho onde me acoite
Oh pomba dos meus anelos!
Quero esconder-me na noite
Profunda dos teus cabelos.
Quero o teu hálito ardente
Aspirar a longos tragos;
Quero sentir os afagos
Da tua fala tremente.
Depois verás como eu canto
Na minha lira de poeta,
Este amor que eu amo tanto,
Oh minha casta violeta...
Como eu te quero! No mundo,
Só eu sei e mais ninguém
O afecto imenso, profundo,
Que o meu coração contém.
À noite, quando me deito,
Vejo o teu rosto, morena;
E, oh pomba casta e serena,
Tu poisas sobre o meu leito.
E na febre em que me abrasas,
Meu doce amor, até creio
Que roçam pelo meu seio
As penas das tuas asas.
E que de manso ao ouvido
Me falas do teu amor;
E que ouço perto o rumor
Das ondas do teu vestido.
Que a minha fronte descança,
A sorrir, nos teus joelhos:
E sinto os beijos, criança,
Desses teus lábios vermelhos.
Sou talvez um sonhador,
Talvez um louco, talvez;
Mas quero beijar-te os pés
Na febre do meu amor.
E tu, se acaso tens pena
Deste meu sofrer profundo,
Ri-te de Deus e do mundo,
E abre-me os braços, morena.
As quadras cantam-se aos pares, como se fossem oitavas, sem quaisquer repetições de versos ou de dísticos. Interpretam-se os restantes blocos intervalados com curtos separadores instrumentais.
Informação Complementar
Fado-serenata estrófico oitocentista em compasso binário simples e tom de Sol Maior, sugerindo movimento sincopado.
Fado recolhido por César das Neves na Praia da Granja, durante a época de veraneio, no ano de 1875, que escutou apenas a versão instrumental a um grupo de "académicos" munidos de guitarras. Solfa disponível em NEVES, César das - Cancioneiro de Musicas Populares. Tomo III. Porto, 1898, disponível em WWW: http://purl.pt/742/1/mpp-21-a_3/mpp-21-a_3_item1/P197.html.
Segundo anotação do recolector, voltou a "reaparecer" na década de 1890, cantado com letra do Conde de Monsaraz, D. António de Macedo Papança (1852-1913) que se bacharelou na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra no ano de 1874 (Cf. entrada da GEPB).
Não é possível determinar se os estudantes vistos e ouvidos pelo musicólogo César das Neves na Praia da Granja eram alunos da Universidade de Coimbra ou de escolas politécnicas de Lisboa ou do Porto. Seja como for, a melodia transcrita não é uma qualquer música impropriamente chamada de Fado(abuso corriqueiro na linguagem oral e escrita conimbricense) mas um Fado "verdadeiro", como diria o guitarrista Afonso de Sousa. Ilustra bem o tipo de fados estróficos que os estudantes de Coimbra gostavam de cantar e acompanhar com as duas tipologias de guitarras definidas e disponíveis na segunda metade do século XIX, a de Lisboa e a do Porto. E ilustra também o tipo de peças vocais que integravam o reportório híbrido de Augusto Hilário na década de 1890, rotulados pela imprensa coeva de "fadinhos".
O facto de ser necessário recorrer a oito versos de redondilha maior para se cantar toda a melodia de Serenata à Morena faz recuar pelo menos em duas décadas a solução do fado-serenata tradicionalmente apontada como grande feito de Augusto Hilário. Confrontando as datas, o Fado Serenata do Hilário foi criado e estreado na Primavera de 1894, eram passados 19 anos sobre a sinalização de Serenata à Morena por César das Neves. Cantaria Augusto Hilário esta composição? Se não temos a certeza absoluta quanto à música, o mesmo já não se pode dizer da 1.ª quadra que, ligeiramente modificada, era entoada pelo aclamado serenateiro, guitarrista e fadista.
De acordo com a informação ao nosso alcance, Serenata à Morena não foi gravada pelos cantores de Coimbra do século XX nem encontrámos testemunhos da sua radicação na cultura oral.
Transcrição: Octávio Sérgio (2011)
Texto: José Anjos de Carvalho e António Manuel Nunes
Leitura da partitura em MIDI:Letra: D. António de Macedo Papança (1852-1913)
Incipit: Quero o teu hálito ardente
Origem: desconhecida
Data: ca. 1870-1875
Eu não tenho onde me acoite
Oh pomba dos meus anelos!
Quero esconder-me na noite
Profunda dos teus cabelos.
Quero o teu hálito ardente
Aspirar a longos tragos;
Quero sentir os afagos
Da tua fala tremente.
Depois verás como eu canto
Na minha lira de poeta,
Este amor que eu amo tanto,
Oh minha casta violeta...
Como eu te quero! No mundo,
Só eu sei e mais ninguém
O afecto imenso, profundo,
Que o meu coração contém.
À noite, quando me deito,
Vejo o teu rosto, morena;
E, oh pomba casta e serena,
Tu poisas sobre o meu leito.
E na febre em que me abrasas,
Meu doce amor, até creio
Que roçam pelo meu seio
As penas das tuas asas.
E que de manso ao ouvido
Me falas do teu amor;
E que ouço perto o rumor
Das ondas do teu vestido.
Que a minha fronte descança,
A sorrir, nos teus joelhos:
E sinto os beijos, criança,
Desses teus lábios vermelhos.
Sou talvez um sonhador,
Talvez um louco, talvez;
Mas quero beijar-te os pés
Na febre do meu amor.
E tu, se acaso tens pena
Deste meu sofrer profundo,
Ri-te de Deus e do mundo,
E abre-me os braços, morena.
As quadras cantam-se aos pares, como se fossem oitavas, sem quaisquer repetições de versos ou de dísticos. Interpretam-se os restantes blocos intervalados com curtos separadores instrumentais.
Informação Complementar
Fado-serenata estrófico oitocentista em compasso binário simples e tom de Sol Maior, sugerindo movimento sincopado.
Fado recolhido por César das Neves na Praia da Granja, durante a época de veraneio, no ano de 1875, que escutou apenas a versão instrumental a um grupo de "académicos" munidos de guitarras. Solfa disponível em NEVES, César das - Cancioneiro de Musicas Populares. Tomo III. Porto, 1898, disponível em WWW: http://purl.pt/742/1/mpp-21-a_3/mpp-21-a_3_item1/P197.html.
Segundo anotação do recolector, voltou a "reaparecer" na década de 1890, cantado com letra do Conde de Monsaraz, D. António de Macedo Papança (1852-1913) que se bacharelou na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra no ano de 1874 (Cf. entrada da GEPB).
Não é possível determinar se os estudantes vistos e ouvidos pelo musicólogo César das Neves na Praia da Granja eram alunos da Universidade de Coimbra ou de escolas politécnicas de Lisboa ou do Porto. Seja como for, a melodia transcrita não é uma qualquer música impropriamente chamada de Fado(abuso corriqueiro na linguagem oral e escrita conimbricense) mas um Fado "verdadeiro", como diria o guitarrista Afonso de Sousa. Ilustra bem o tipo de fados estróficos que os estudantes de Coimbra gostavam de cantar e acompanhar com as duas tipologias de guitarras definidas e disponíveis na segunda metade do século XIX, a de Lisboa e a do Porto. E ilustra também o tipo de peças vocais que integravam o reportório híbrido de Augusto Hilário na década de 1890, rotulados pela imprensa coeva de "fadinhos".
O facto de ser necessário recorrer a oito versos de redondilha maior para se cantar toda a melodia de Serenata à Morena faz recuar pelo menos em duas décadas a solução do fado-serenata tradicionalmente apontada como grande feito de Augusto Hilário. Confrontando as datas, o Fado Serenata do Hilário foi criado e estreado na Primavera de 1894, eram passados 19 anos sobre a sinalização de Serenata à Morena por César das Neves. Cantaria Augusto Hilário esta composição? Se não temos a certeza absoluta quanto à música, o mesmo já não se pode dizer da 1.ª quadra que, ligeiramente modificada, era entoada pelo aclamado serenateiro, guitarrista e fadista.
De acordo com a informação ao nosso alcance, Serenata à Morena não foi gravada pelos cantores de Coimbra do século XX nem encontrámos testemunhos da sua radicação na cultura oral.
Transcrição: Octávio Sérgio (2011)
Texto: José Anjos de Carvalho e António Manuel Nunes
(Serenata Àà Morena)
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