sábado, 26 de março de 2011

FADO CANÇÃO D'AMOR



Música: Reynaldo Augusto Álvares Leite da Silva Pinto Varela (1867-1940)
Letra: Reynaldo Augusto Álvares Leite da Silva Pinto Varela (1867-1940)
Incipit: Suspira o meu coração
Origem: Lisboa
Data: ca. 1903

Suspira o meu coração
Ao cantar meu sofrimento
A minh'alma torturada
Dilacera o pensamento.


Ai quantas vezes eu sonho
Numa mulher ideal
Que me dulcifiquei o mal
Deste meu viver tristonho.


Horas passadas na angústia
Duma vida amargurada
Na terrível incerteza
Do amor da minha amada.


No coração nasce a dor
Nos lábios morre a alegria;
Após amor outro amor;
Tudo acaba dia a dia.

Canta-se cada uma das quadras de seguida e repete-se.

Informação complementar:

Cançoneta ligeira, em compasso binário simples (2/4), na tonalidade de Dó Maior.

Composição literário-musical incaracterística, originarimente destinada a ser acompanhada à guitarra do Porto em afinação natural. A melodia, de marcada simplicidade, tanto poderia ser cantada nos salões por respeitáveis burguesas tocadoras de piano, como interpretada pelo próprio autor no paço real (Varella terá ministrado lições de guitarra e proporcionado audições ao rei D. Carlos I), ou mesmo entoada nos estilos consagrados pelos serenateiros de Coimbra e pelos fadistas activos em Lisboa e no Porto.

Reynaldo Varella foi um compositor/cantor/executante de guitarra do Porto muito reproduzido em Coimbra entre ca. 1890-1940, através do seu reportório impresso e profusamente gravado em discos pelo próprio. Algumas das suas obras mais emblemáticas, como o Fado das Três Horas (Murmura, rio murmura) eram abundantemente tocadas por bandas filarmónicas e tunas.

Há dúvidas quanto ao local de nascimento deste guitarrista. Pesquisas recentes nos arquivos paroquiais de Ponte de Lima ainda não permitiram confirmar os dados do verbete da GEPB, havendo quem coloque como provável local de nascimento Guimarães. O que se sabe é que o autor era descendente dos Morgados de Tabuaço e filho de um escritor e cantor de mérito. Um seu tio, Coronel de Infantaria, também era músico. Um ascendente ligado à execução da guitarra foi o monge beneditino Frei Domingos Varella. Professor de instrumentos de corda, Reynaldo Varella viveu regularmente no Porto nas décadas de 1870, 1880 e 1890, tendo sido um dos executantes mais proeminentes da Guitarra do Porto. Dominava um extenso reportório constituído por fados, serenatas, baladas, valsas, apropriadas aos gostos aristocrático e burguês da Belle Époque e interpretava peças instrumentais extraídas da obra de compositores clássicos, na boa tradição dos tocadores de guitarra inglesa.

Em 1900 foi dos primeiros a gravar discos de 76 rpm, de uma só face, em rodelas de zinco, para a Gramophone, seguindo-se até ca. 1912 dezenas de registos fonográficos. Elaborou e publicou dois métodos para guitarra, do Porto, entenda-se, que era o instrumento que melhor dominava e tocava habitualmente. Barítono, era carinhosamente alcunhado o "Liszt da guitarra", tendo tocado para reis, presidentes e notabilidades. Consta que deu aulas de guitarra ao Rei D. Carlos I. E se não deu, a historieta quadra bem com os gostos dos últimos Braganças que sabiam música e gostavam de ouvir guitarristas. Na antiga sala de música do Palácio Nacional de Mafra há exemplares de guitarrilhas que eram tocadas e ouvidas nos serões da corte.

Obra editada editada em partitura impressa pela Typografia Eduardo Rosa, Lisboa, sem data. Tema gravado pelo autor, Reynaldo Varela, em Lisboa, ca. 1911, no 78 rpm Homokord 9294. A 2.ª quadra padece de alguma falta de finura.

Transcrição: Octávio Sérgio (2011)
Texto: José Anjos de Carvalho e António Manuel Nunes
.
Leitura da partiutura em MIDI
(Link)

Mata de Lobos

Paulo Soares executa, de sua autoria, "Mata de Lobos", uma peça bem actual.

Romance do Grande Gatão

História para crianças de Sérgio Azevedo


quinta-feira, 24 de março de 2011

António Ralha na guitarra, Adelino Marques na viola, Emília Ralha e Ilídio Sobral Gomes.
Termina aqui a publicação das fotos que António Ralha amavelmente nos cedeu.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Tertúlia Académica com JORGE CRAVO

ASSUNTO: Tertúlia Académica com JORGE CRAVO, um dos melhores intérpretes da Canção de Coimbra, dia 2 de Abril, Sábado, Almoço, no Restaurante “Espaço Tejo” (antiga FIL, à Junqueira).

Em parceria com a Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra em Lisboa, vamos levar a efeito uma Tertúlia Académica, no próximo dia 2 de Abril, Sábado, Almoço, no Restaurante “Espaço Tejo” (antiga FIL, à Junqueira), oportunidade única para confraternizarmos com JORGE CRAVO, um dos melhores intérpretes e cultores da Canção de Coimbra por ocasião do lançamento do seu último trabalho “Canções  d’uma Cidade e d’um Rio”.

Programa:
12h45 – “Coimbra de Honra”.
13h15 – Almoço.
15h00 – Tertúlia Académica:
- Boas-vindas pelos Presidentes da AAECL e CAL, Fátima Lencastre e Joaquim    Couto.
- Apresentação da Tertúlia por “Tito” Costa Santos.
            - Atuação do Grupo “Serenata ao Luar”.
            - “Percurso de Jorge Cravo” por Luiz Goes.
            - Palavras sobre a Canção de Coimbra por Luís Martins.
            - Apresentação de “Canções d’uma Cidade e d’um Rio” por Jorge Cravo. 
16h00 - Atuação do Grupo “Quarteto de António Moreira” com Jorge Cravo.

Apelamos aos Sócios e Amigos da CAL para que participem nesta Tertúlia que inicia uma parceria com a AAECL e será, sem dúvida, um momento forte de confraternização académica e oportunidade única para vivermos Coimbra, a sua Canção e os seus Intérpretes.

Inscrições: o preço do almoço é de 26 “briosas” e as inscrições podem ser efetuadas até ao dia 1 de Abril para: Alfredo Ribeiro 967 004 992, Gustavo Cerdeira 966 066 303, Joaquim Freire 914 958 224, Joaquim Couto 918780 660.

Saudações Académicas

Joaquim Couto
Presidente da Direcção

CENTENÁRIO DA UNIVERSIDADE DO PORTO

1911/03/22 – 2011/03/22

Edifício projectado por Carlos Amarante (1748-1815), sede, sucessivamente, da Academia Politécnica do Porto, da Reitoria / UP e das Faculdades de Ciências, de Engenharia, de Letras e de Economia, para além do Instituto Industrial do Porto;
desde 2006, sede da Reitoria, do Arquivo e de diversos museus.
Em 1º plano, a fonte dos Grifos (conhecida como “dos Leões”).
O largo fronteiro tem a designação oficial de Praça Gomes Teixeira.
Fonte: <jpn.icicom.up.pt> (consultado em 2011/03/15)
De novo a “Fonte dos Grifos”.
Fonte: <tampf.blogs.sapo.pt> (consultado em 2011/03/15)

Hospital de St.o António, projecto do inglês John Carr (1723-1807).
Aqui se iniciou o ensino do ciclo clínico da Escola Médico-Cirúrgica do Porto.
Fonte: <arkitectos.blogspot.com> (consultado em 2011/03/15)
Faculdade de Farmácia / UP, à rua Aníbal Cunha
(imagens de 1927- com o edifício ainda em construção - e da actualidade)
Fontes: <aeffup.com> e <jpn.icicom.up.pt> (consultados em 2011/03/15)
Edifício que foi sede da Faculdade de Medicina (c. 1930-1959).
Ulteriormente sede das Faculdades de Ciências (Grupo de Química), de Letras e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, patrono que deu o nome ao largo fronteiro. Por aqui passaram também as sedes do Orfeão Universitário do Porto, do Teatro Universitário do Porto, do Coral de Letras de UP e do Instituto Superior de Educação Física, actual Faculdade de Desporto (FADE/UP)
Fonte: <icbas.up.pt> (consultado em 2011/03/15)
Edifício que foi sede da Faculdade de Engenharia (1937-2001), à rua dos Bragas.
Actual sede da Faculdade de Direito (2004 ss.)
Fonte: <ligo.pt> (consultado em 2011/03/15)
António José de Almeida
(1866-1929)
Ministro do Interior do Governo Provisório da República (1910-1911) e, como tal,
responsável pela legislação de 1911/03/22 que criou (ou, no segundo caso, recriou)
a UP e a UL. Fundador e líder do Partido Evolucionista, foi Presidente do Ministério
(1916-1917) e Presidente da República (1919-1923)
Fonte: <leme.pt> (consultado em 2011/03/15)

Francisco Gomes Teixeira
(1851-1933)
Retrato de Abel Moura, UP, Reitoria
Matemático insigne, doutor pela UC (1875), onde chegou a lente (1881), a partir de 1883 ensinou na Academia Politécnica do Porto, Escola de que foi o último Director (< 1911). Primeiro Reitor da UP
(1911-1917)

Fotos e textos enviados por Armando Luís de Carvalho Homem.

terça-feira, 22 de março de 2011

A UNIVERSIDADE DO PORTO E A 1.ª REPÚBLICA*

Armando Luís de Carvalho Homem
            Como é da «sabedoria das nações», a UP é uma criação do Governo Provisório da República, por decorrência do Decreto com força de lei de 22 de Março de 1911. A tutela do Sistema Educativo passava então pelo ministério do Interior – como até 1910 passara pelo ministério da Reino: de facto, o ministério que dos anos 10 aos anos 30 de Novecentos se chamará «da Instrução Pública», com ocasionais antecedentes na segunda metade de Oitocentos, apenas surgirá definitivamente em 1913. Em 1911 a pasta do Interior era desempenhada por um ícone do novo Regime, António José de Almeida. Por ele passou, com efeito, toda a obra inicial da República em matéria de Ensino Superior: a reforma da UC e a federação das Escolas Superiores de Lisboa e do Porto em duas novas Universidades. Por alguma razão, durante muito tempo se lhe chamou entre nós «o fundador», e de longa data existe na nossa Reitoria um retrato seu, a par do de outro pai-fundador, o então príncipe regente, futuro D. João VI, fundador da Academia Real da Marinha e do Comércio, em 1803.
            O prelúdio das reformas fundacionais de António José de Almeida encontrava-se logo em Novembro de 1910, com a transformação das duas Escolas Médico-Cirúrgicas em Faculdades de Medicina, ministrando todos os diplomas e graus da congénere coimbrã; congénere coimbrã, aliás, cuja extinção terá estado iminente, travada «in extremis» pelo prestígio científico e profissional de dois dos seus lentes, o psiquiatra Elísio de Moura e o obstetra Daniel de Matos.
            Mas voltando ao Porto: tem sido dito que a criação da Universidade surgiu em 1911 como algo de inesperado, porventura decepcionante, na Cidade e na Região. Nesse mesmo sentido se exprimia, há cerca de meio século, alguém que era ao tempo o último sobrevivente do Corpo Docente das Escolas Superiores do Porto, o lente jubilado de Física da Faculdade de Ciências Alexandre Alberto de Sousa Pinto (1880-1982), que iniciara carreira em 1902 na Academia Politécnica. Falando em Outubro de 1961 na sessão solene do cinquentenário da UP, Sousa Pinto afirmou, a dado passo, o seguinte:  

§  «Poucos meses decorridos sobre a data da fundação da República, foi o Porto surpreendido, ao ler os jornais da manhã do dia 24 de Março de 1911, com a notícia da publicação dum decreto criando duas novas Universidades, uma em Lisboa, outra no Porto, e anunciando que o Governo publicaria ulteriormente um diploma sobre a Constituição universitária (…). Nenhum movimento de opinião, nenhuma campanha de imprensa, tinham precedido a publicação destes decretos, que foram de iniciativa espontânea do Governo provisório da República».

            Para além, portanto, da surpresa, a decepção relativa: no fundo, a UP surgia sem nenhuma Escola verdadeiramente nova, antes, e no essencial, com transformações das preexistentes: a Academia Politécnica dava lugar à Faculdade de Ciências, com uma Escola de Engenharia incorporada; a Escola Médico-Cirúrgica dava lugar à Faculdade de Medicina, com uma Escola de Farmácia anexa. Ou seja, o esboço, já, do que viriam a ser, por bastas décadas, as quatro Faculdades do Studium Generale portuense, ficando por concretizar a criação de um Instituto Superior de Comércio e com processos acidentados umas vezes, demorados noutras, no que toca a inclusão de domínios científicos diversos, que não os que, no fundo, vinham do século XIX. É evidente que o quadro disciplinar da nova Faculdade de Ciências surgia como significativamente ampliado em relação a tempos anteriores, da Matemática Pura e Aplicada à Física, à Química, à Botânica, à Zoologia, à Antropologia, à Paleontologia, à Geologia; sem esquecer os cursos de Engenharia (em nova Faculdade anos decorridos) e os cursos de preparação para as Escolas Militar e Naval. Mas a diversidade disciplinar dos novos diplomados, obviamente, só se tornaria visível com o passar do tempo, a partir do ano escolar de 1911/12. No fundo, é ainda um pouco essa sensação deceptiva que se percebe noutra passagem da intervenção de Alexandre Sousa Pinto em 1961:  

§  «Na manhã do dia em que ia ter lugar a inauguração da Universidade [16 de Julho de 1911], publicou oComércio do Porto” um artigo em que se manifestava o desejo de que uma Faculdade Técnica e uma Faculdade de Filosofia e Letras viessem a ser criadas, sem esquecer também uma Escola Normal superior, e se dizia que a nova Universidade devia ser considerada apenas como o núcleo duma criação mais vasta, que se esperava viria a realizar-se em breve, afirmando que só assim se poderia contribuir para que a cidade do Porto e o norte do País viessem a bendizer a nova organização».

De alguma maneira, um primeiro momento de entusiasmo, digamos assim, da Cidade com o novo quadro de Ensino Superior que passava a ter intra-muros, só se dará na mencionada data de 16 de Julho, quando António José de Almeida se desloca ao Porto a fim de presidir ao acto de instalação da Universidade e de designação pela Assembleia da mesma do primeiro Reitor – mediante a elaboração de uma tríplice lista de nomes, não obrigatoriamente pertencentes ao claustro, a apresentar ao Executivo, para ulterior escolha por este último. O nome com maior número de votos (23 em 48) foi o do matemático Francisco Gomes Teixeira, efectivamente nomeado dias depois para o cargo reitoral, que exerceria até 1917. Correntemente considerado nome cimeiro na Matemática portuguesa desse tempo, Gomes Teixeira detinha um percurso académico todo ele feito na Universidade de Coimbra, onde se doutorara em 1875 e chegara a lente em 1880; em 1885, razões familiares haviam determinado o pedido de transferência para a Academia Politécnica, de que viria a ser, e a partir de 1886, o último Director.
Ora, meses decorridos sobre o momento instituidor de Julho, outro evento minimamente visibilizante ocorreu: foi a 1 de Novembro, com a abertura solene do ano lectivo de 1911/12, sob a presidência do então ministro do Fomento, Sidónio Pais. O novo Studium Generale ia começando a mostrar-se.

Nos cerca de 15 anos da República, as 4 Faculdades como que prenunciadas em 1911 ganharam efectivamente corpo:

·         Em 1915 separa-se de Ciências a então chamada Faculdade Técnica (de Engenharia a partir de finais de 1926);

·         e no mesmo ano a Escola de Farmácia autonomiza-se em relação a Medicina, ganhando estatuto de Faculdade em 1921.

Paralelamente, as complicadas génese, vivência e morte da primeira Faculdade de Letras, entre 1919 e 1931.

A UP nasceu então com a República. Ao longo de cerca de década e meia, a UP deu-se bem com a República ? 
Em termos de regime, talvez não se tenha dado propriamente mal. Pergunto-me, aliás, se o positivismo alegadamente reinante nas Escolas portuenses, mormente a Politécnica, na viragem do século não seria mesmo potencialmente convergente com o ideário republicano. Porque creio esclarecedor o facto de a já mencionada pasta da Instrução Pública, surgida, como disse, em 1913, ostentar entre os seus titulares, e até 1928, 5 membros do Corpo Docente portuense, e alguns por mais do que uma vez: concretamente, António Joaquim de Sousa Júnior, João Lopes Martins e Alfredo de Magalhães (por duas vezes), de Medicina; Augusto Nobre (por 3 vezes), de Ciências; e Leonardo Coimbra (também por 3 vezes), de Letras; acrescentemos, na pasta das Finanças, Armando Marques Guedes, ao tempo professor da Faculdade Técnica, último titular da mesma em 1925-1926. Ou seja, em ministérios onde só no Estado Novo se estabeleceu praticamente como norma o exercício por mestres universitários, esta repetida presença do Porto em pastas uma das quais criação definitiva da própria República não poderá, quanto a mim, ser vista como casual ou insignificativa.
E em termos de viver quotidiano, de condições materiais e logísticas, de orçamentos e financiamentos, a UP viveu bem nos anos de 1911 a 1926 ?  Na conjuntura que hoje vivemos, não deixa de ser com amarga ironia que me julgo em condições de salientar que os nossos remotos antepassados desse tempo viveram problemas nada fáceis, e, às vezes, tão duros como os que hoje obsessivamente nos (pre)ocupam…
Repare-se: a UP arrancou – e conservou durante décadas – com quatro Unidades Orgânicas no fundo já existentes ou prefiguradas antes de 1911. E, para tal, herdou exactamente os mesmos edifícios, isto é, dois:

·         O histórico edifício de Carlos Amarante (1748-1815), sede da Politécnica, em prolongada construção ao longo das últimas décadas de Oitocentos e ainda não concluído em 1911; na primeira década de existência da Universidade esta Casa-Mãe albergou Reitoria, Secretaria-Geral e outros Serviços Centrais, a Faculdade de Ciências e a Escola de Engenharia que integrava, as disciplinas preparatórias de Medicina, os cursos de acesso ao Ensino Militar e até, a partir de 1919, os 2 anos iniciais de funcionamento da Faculdade de Letras.

·         o outro edifício era o da bem pouco imponente sede da Medicina, construído na segunda metade do século XIX para sede da Escola Médico-Cirúrgica na antiga cerca dos Terceiros Carmelitas; o Actual edifício-sede do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, substituição e ampliação do anterior, só foi construído na década de 20, com finalização ca. 1930; valia entretanto à Faculdade de Medicina que as disciplinas do ciclo clínico eram leccionadas no vizinho Hospital de St.º António.

Engenharia e Farmácia iriam dispor também de casas próprias, na Rua dos Bragas e na hoje Rua Aníbal Cunha, respectivamente. Só que tais casas passaram por demorados processos de edificação nas décadas de 20 e de 30 e só dadas por concluídas e oficialmente inauguradas em 1937, ainda que Farmácia desde ca. 1925 pudesse utilizar a parte do edifício voltada para a actual igreja paroquial de Cedofeita. Portanto, os espaços da Universidade do Porto foram inicialmente, e durante mais de 20 anos, exactamente os existentes ao tempo da Politécnica e da Médico-Cirúrgica.
E se passarmos a questões como as dos orçamentos e dos financiamentos, é evidente – e com que amargor o lembro no momento em que lhes falo… – que Reitores e Directores de Faculdade passassem não raro por suores frios… Apenas dois exemplos:

·         Em 1919, pouco depois de deixar o cargo reitoral, Gomes Teixeira testemunhava em reunião do Senado que em 1911 a Escola de Engenharia – até então integrada na Politécnica e que foi portanto o gérmen da futura Faculdade Técnica – «esteve a cair»; e só a compreensão de António José de Almeida evitara tal desfecho;

·         cerca de 10/11 anos mais tarde, razões de suposto prejuízo fizeram pairar sobre a UP a ameaça de extinção das Faculdades de Farmácia (recém-instituída como tal…) e de Letras (que remontava apenas a 1919…); valeu então a persistência e o «savoir faire» do Reitor Augusto Nobre, que por esses anos, e como já se disse, passou por 3 vezes pela pasta da Instrução.

Ou seja, uma coisa terão sido entre 1911 e o termo da República, um quotidiano de normal funcionamento de actividades, sem nenhuma verdadeira «crise académica»; outra terão sido circunstâncias como as referidas, pouco ou nada chegando ao tempo a conhecimento público, mas duramente enfrentadas pelos líderes da comunidade académica.

Em 28 de Maio de 1926 o golpe sob aparente liderança militar de Gomes da Costa começa o pôr termo à situação constitucional remontante a 1910/11. Por ironia do destino, as 3 Universidades portuguesas terão no imediato uma última oportunidade (até á década de 1980…) de escolha electiva dos seus Reitores, por decisão do efémero ministro da Instrução Pública do não menos efémero gabinete Cabeçadas, o lente de Filologia Românica da Universidade de Coimbra (e seu antigo Reitor) Joaquim Mendes dos Remédios. A Reitoria portuense passará a ter, e até 1928, a presença de um republicano conservador e antigo ministro da Instrução de Sidónio Pais, o Doutor José Alfredo Mendes de Magalhães, da Faculdade de Medicina. E o ano de 1926 não chegará ao seu fim sem que, justamente em Dezembro, a Faculdade Técnica passe a ostentar o nome que ainda hoje é o seu: «de Engenharia». Mas o Reitor Alfredo de Magalhães fora entretanto, e de novo, chamado à pasta da Instrução, onde permanecerá até Abril de 1928, sendo portanto um dos seus últimos actos como tal a assinatura do decreto extinguindo (ou pretendendo extinguir) diversos estabelecimentos de Ensino Superior, entre os quais, irreversivelmente, a Faculdade de Letras da UP. Não me demoro hoje neste ponto mais do que o estritamente indispensável. Longe de qualquer visão ‘sacralizante’ da Escola, direi apenas que tudo o que lhe concerne tem sido essencialmente tratado por um prisma político-partidário e até ideológico, com as naturais paixões decorrentes; e que lhe faltam abordagens estritamente académicas e culturais. Também não deixarei de dizer que em finais da década, ainda não consumado o encerramento da Faculdade, um Reitor de campo conservador e monárquico, o já mencionado físico Alexandre de Sousa Pinto, luta evitar tal desfecho, e que um Mestre republicano da Escola, Hernâni Cidade, concretamente, reconhece, sensibilizado, tal sentido de actuação reitoral.

     As 4 Faculdades que até à década de 50 corporizaram a UP dispunham, já em 1925, de um Corpo Docente de valor inequívoco, não raro reconhecido além-fronteiras:

·         Pensemos, em Ciências, nos matemáticos Gomes Teixeira e Luiz Woodhouse, no químico José Pereira Salgado, nos botânicos Gonçalo Sampaio e Américo Pires de Lima, no antropólogo Mendes Corrêa e no zoólogo Augusto Nobre, a eles se agregando diversos assistentes a iniciar carreira mas com futuro inequívoco: Scipião de Carvalho e Rodrigo Sarmento de Beires em Matemática e Santos Júnior em Antropologia;

·         pensemos, em Medicina, nos anatomistas Joaquim Pires de Lima e Hernâni Monteiro, no histologista Abel Salazar, no fisiologista Alberto de Aguiar, no clínico Tiago de Almeida, no cirurgião Álvaro Teixeira Bastos e no psiquiatra Magalhães Lemos, acrescidos dos jovens Amândio Joaquim Tavares (Anatomia Patológica), Alfredo Rocha Pereira (Clínica Médica) e Manuel Cerqueira Gomes (Idem);

·         pensemos, em Farmácia, na figura tutelar do Director Aníbal Cunha e nos assistentes Aníbal Albuquerque e Armando Laroze Rocha;

·         consideremos, finalmente, a Faculdade Técnica, Escola ao tempo com uma interessante componente de Mestres que eram também militares de carreira, como o general Vitorino Laranjeira (Construções Civis) e o tenente-coronel João Ascensão (Minas). Acrescentemos os nomes de Luís Couto dos Santos (Electrotecnia) e Bento Carqueja (Economia Social), bem como o então assistente António Bonfim Barreiros (Construções Civis).

Para além de valias científicas, a UP configurara-se espacialmente em pleno tecido urbano, a partir de 2 edifícios cobrindo uma área relativamente restrita do mesmo: «dos Clérigos ao Carregal», como tive oportunidade de me exprimir há quase 20 anos. Vizinhando com quarteirões habitados, a interacção entre docentes e discentes e a população proximamente residente fôra, naturalmente rápida, e remontante a Oitocentos: as zonas habitadas do Jardim da Cordoaria, da Rua de Cedofeita ou do Jardim do Carregal, por exemplo, cedo veriam surgir hospedarias, pensões, cafés ou restaurantes populares de frequência estudantil. As expansões em matéria de edifícios nas décadas de 20 e de 30 prosseguiriam o espaço matricial pelos eixos de Cedofeita (até à R. dos Bragas – sede da Faculdade de Engenharia) e das Ruas do Rosário / Boa Hora, até às imediações da igreja românica de Cedofeita – sede da Faculdade de Farmácia. Só a partir dos anos 50, com o Estádio Universitário, o Jardim Botânico e o Hospital de S. João, se esboçariam expansões claramente para além do perímetro mencionado.

Hoje, a UP, no quadro dos 3 pólos configurados a partir de há cerca de 55 anos, tem-se repetidamente reclamado como «a maior do País», de um ponto de vista da quantidade de docentes, investigadores, funcionários, discentes, Unidades Orgânicas, Unidades e Projectos de Investigação and so on… Mas independentemente de tudo isso, a UP, encarada numa já possível longa duração, tem-se revelado, e independentemente das sucessivas situações políticas, uma das mais estáveis instituições de Ensino Superior do nosso País. Será isso compreensível sem um ter em conta dos 15 heróicos anos iniciais, vividos no quadro da Constituição e dos actos legais fundadores de 1911 ?


* Intervenção de abertura no workshop sobre o República e Republicanismo em Portugal e no Brasil (FL/UP, 2010/05/21).

segunda-feira, 21 de março de 2011

Poesia, no seu dia

—Por onde
andarás hoje,
neste teu dia,
Poesia?
Pela Praça da Canção,
ou pela Rua da Alegria?
—Por Coimbra é que não,
que anda de mim arredia.
Irei para longe,
para o Japão,
que por ora
chora;
ou para Bengasi,
que é logo ali,
e sobrevive
em agonia.
“Vou‐me embora,
vou partir...”,
mas antes, se não é muito pedir,
uma rima branca
e um ritmo livre
é que já ia...

Flávio Pinho, Coimbra, 20/3/2011

Carta de Manuel Marques Inácio enviada à Directora do Museu do Fado
Dra. Sara Pereira
Muito boa tarde.
 Apesar de passar muito tempo sem a contactar, vou acompanhando algum do seu trabalho, e permita-me que lhe diga, quanto considero que sei que tem desenvolvido, sobretudo no domínio do conhecimento e valorização do Fado de Lisboa e na sua canditatura a Património da Humanidade- candidatura Unesco. Por falha minha, só agora li com mais atenção, a informação que disponibilizam no site do Museu. Este meu desabafo é quase uma carta aberta construtiva e, acredite que no melhor sentido. Todos temos o dever de participar e de fazer um pouco mais pela cultura da nossa Terra.
Por essa razão, pela necessidade contribuir para a definição de fontes mais rigorosas, e pelo muito respeito que tenho pelo que conheço do seu trabalho, permita-me que lhe faça uma pergunta sobre mestre Artur Paredes e algumas reflexões sobre a biografia de seu filho, mestre Carlos Paredes, apresentada na área "Personalidades".
Face à importância que julgo que se deve atribuir ao assunto, passo a expor:

- Sobre mestre ARTUR PAREDES.
Qual o critério de incluir em "Personalidades" ligadas ao Fado de Lisboa, o grande mago da guitarra de Coimbra, que nunca, compôs Fados de Lisboa, nunca acompanhou Fados de Lisboa, nada tem a ver com o Fado de Lisboa, a não ser como homem culto e sensível, artista sério e discreto, de dimensão invulgar, saber reconhecer o valor e a maestria de um Armandinho, de um José Nunes e de alguns outros, numa atitude construtiva e digna.
Com toda a sinceridade não consigo perceber. Procurei outros cultores da Canção (Fado de Coimbra), cantores e instrumentistas, e não encontrei mais ninguém, sendo certo que alguns grandes nomes do universo da Canção (Fado de Coimbra), interpretaram e gravaram, Fados de Lisboa.
Será que a ideia é de que as suas composições, tais como a de seu filho, mestre Carlos Paredes, estão acima, dos universos de Coimbra e de Lisboa, atingindo uma dimensão superior? Sendo assim, ainda que discutível, deverá ser explicado.
Sendo o mestre Artur Paredes, o grande mago da definição da guitarra de Coimbra, da composição e do desempenho no domínio da matriz musical coimbrã mais pura, que abarca a autenticidade da influência popular e da académica, tal particularidade tem de ser explicada. Por outro lado, a sua técnica de execução é ímpar e diferente da de seu filho, o grande mestre da guitarra portuguesa, reconhecidamente o maior neste domínio, e essa realidade, tal a sua dimensão quase sublime, merece uma palavra.

- Sobre mestre CARLOS PAREDES.
Li a biografia que aparece, dentro da página "Personalidades", e fiquei preocupado. Peço o favor de mandar consultar as vossas fontes, pois eventualmente, poderei eu estar a falhar aqui ou ali, e estou muito a tempo de aprender. Assim:
1 - No primeiro parágrafo diz-se: " ... Com o pai Carlos Paredes aprendeu as primeiras posições de mão na guitarra e, por brincadeira, começou com cerca de 9 anos a acompanhar o pai".
Desconheço que Carlos Paredes alguma vez tenha afirmado tal.
Pelo contrário, por exemplo em "Mundo da Canção, nº 54, de 30 de Junho de 1980, pp 12 e 13, em entrevista de Sérgio Ferreira Borges, Carlos Paredes diz: " ...- O meu pai nunca me ensinou directamente, a não ser um único gesto para agarrar a guitarra. Foi a ouvi-lo que eu fui aprendendo....". Ver por exemplo "A Guitarra de um Povo" de Octávio Fonseca Silva, pp 128 e 129, edições de Biografias MC, ano de 2000, Porto. Claro que há outros depoimentos neste sentido.
2 - Ainda no primeiro parágrafo afirma-se: "Mais tarde, já com 14 anos, apresenta-se em parceria com Artur Paredes num programa semanal, da autoria deste, na Emissora Nacional."
Desconheço por completo esta situação, e não consegui encontrar quem me possa esclarecer.
Poderão fazer o favor de me facultar as fontes, que permitem afirmar tal, que se tal se terá passado em 1939? Não esquecer que Carlos Paredes, nasce em 1925.
3 - No terceiro parágrafo, afirma-se que " .. por volta de 1931 a família instala-se em Lisboa."...
A transferência da família, dá-se no início de 1934, pois mestre Artur Paredes, inicia a 27 de Fevereiro desse ano, novas funções na sede do Banco Nacional Ultramarino em Lisboa.
Ainda neste parágrafo "...Faz o exame de admissão ao Curso Industrial do Instituto Superior Técnico, em 1943, mas frequenta apenas o primeiro ano."
No Instituto Superior Técnico, não consta que Carlos Paredes, tenha tido qualquer inscrição.
Nunca terminou o ensino secundário.
Os amigos que com ele contactaram sabem que nunca acabou o curso liceal. É fácil, basta consultar o seu processo individual, como funcionário público que foi.
4 - No quinto parágrafo, é dito: "Carlos Paredes casou por duas vezes, a primeira com Ana Maria Napoleão, em 1960, e a segunda com Cecília de Melo.".
Apenas conheço um casamento de mestre Carlos Paredes. O primeiro referido.
Da relação com Cecília de Melo, nasceram mais 3 filhos, é verdade, mas estou convicto que Cecília de Melo, nunca terá afirmado que tenha casado com Carlos Paredes. Relacionou-se com ele, musicalmente e afectivamente, como por exemplo Luísa Amaro, mas tanto uma como outra, que eu saiba, nunca afirmaram ter casado com o mestre.
5 - No oitavo parágrafo é expresso que: " A sua carreira musical iniciou-se com a sua aventura discográfica, o EP "Carlos Paredes" datado de 1957.  ..."
Não. A sua carreira musical, em termos de gravações, inicia-se em Setembro de 1957, sim, mas acompanhando o Dr. Augusto Camacho Vieira (n. 1924), num disco EP Columbia, SEGC 35 (Fados de Coimbra - Dr. Augusto Camacho Vieira). Disco que volta a ser reeditado em 1958. Neste disco, o violista foi António Leão Ferreia Alves (1928 - 1995), advogado, uma grande figura de violista de Coimbra, cedo radicado em
Lisboa.
O EP "Carlos Paredes", que é um EP, Alvorada, AEP 60.508, é datado de 1962.

Dra Sara Pereira, existem mais alguns erros e omissões, que deveriam ser devidamente analisados, sobretudo tendo em atenção a função informativa, explicativa e de apoio à investigação, que está inerente aos objectivos do Museu.
Exemplos: "Luís Goes". O Luís é com "z". Por outro lado, Carlos Paredes, não me parece que tenha sido "suspenso" da Função Pública, em 1960, na sequência de um último julgamento a 23 de Março, desse ano. Foi "expulso" pela ditadura, por ser um homem de esquerda. Era um idealista, sonhador e um homem sério. Militou no Partido Comunista.
Foi denunciado por um colega de trabalho.
E mais haveria por dizer, mas não devo abusar da sua paciência e disponibilidade.
As situações referidas, são salvo melhor opinião, aquelas que considero mais significativas, e para as quais peço a sua melhor atenção. Obrigado.

Atenciosamente

Manuel Marques Inácio

domingo, 20 de março de 2011

Jorge Gomes (g), António Ralha (g) e Horácio Leitão (v) em 1959.

Heitor Lopes e Mário Rovira cantam "Trova Nova", num espectáculo dos Antigos Tunos em Pombal, a 20-9-2008, acompanhados pelo grupo Raízes de Coimbra, com Humberto Matias (v), José Ourives (g), Octávio Sérgio (g), Alcides Freixo (g) e Luís Filipe (v).

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